É pura mentira / Konstatinos Kaváfis
I
Nunca
vivi no campo. Tampouco lá passei, como outras pessoas, breves temporadas. Entretanto
escrevi um poema no qual celebro o campo e digo que a ele se devem os meus
versos. Esse poema de pouco valor não é a coisa mais insincera que já escreveu:
é pura mentira.
Ocorre-me
também agora: trata-se verdadeiramente de insinceridade? Não mente sempre a
arte? E não é quando mente que ela mais se revela mais criativa? Aqueles versos
meus não eram um efeito da arte? (que não fossem bem logrados talvez não se
devesse à falta de sinceridade; malogra-se muitas vezes sob o império de uma
emoção sincera). No momento em que os escrevia não estava eu imbuído de
sinceridade artística? Não imaginei então que era como se tivesse de fato
vivido no campo?
(Konstantinos
Kaváfis, in Reflexões sobre poesia e ética. Tradução de José Paulo Paes. Editora
Ática, 1998)
Sobre
o autor:
Konstantínos
Kaváfis (Alexandria, 29 de abril de 1863 — Alexandria, 29 de
abril de 1933) foi um poeta grego, geralmente considerado o maior nome da
poesia em idioma grego moderno. Por vezes, seu nome aparece creditado como
Constantine P. Cavafy.



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